sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Ei!


Esqueça a cama;
Esqueça a TV;
Esqueça o terremoto;
Esqueça Travis no Taxi;
Esqueça Parnassus;
Esqueça Preciosa;
Esqueça os camundongos do teu quarto;
Esqueça o Nimesulida e o quelo;
Esqueça suas unhas roidas e seu esmalte descascado;
Esqueça o resto de pizza na cozinha;
Esqueça seus óculos escuros e a luz irritante do sol;
Esqueça seus vizinhos;
Esqueça a madrugada;

Acorde!

Chá forte.

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quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

O antebraço e a madona

Lá estava eu, completamente entediada.
Meu pai não parava de ver relógios e minha mãe... Bem, mamãe ainda estava indecisa com aqueles malditos óculos escuros.
Eu? Pra lá e pra cá. Ia à seção de camisetas masculinas, já que sempre encontro estampas de cerveja ou comics. Nada. Os designers filhos da puta não fizeram nada que se aproveitasse. Ia à seção de calças femininas. Porcarias. Não tinham aquelas calças skinny com estampas escrotas que tanto gosto. Só umas coisas pra meninas frescas, falsamente delicadas.

Voltei para ver se meus genitores resolveram algo... Porra nenhuma!
Já estava ficando puta e resolvi ir para a parte dos calçados - nada que eu pudesse comprar, mas ao menos tinham cadeiras!
Sentei confortavelmente e liguei meu mp3...não lembro se eram os Stray Cats ou os Beatles pulando e lambendo meus ouvidos dentro do celular...Ah, mamãe! Já decidiu? Não?! Como não?!?! O quê?!?! Precisa de mim pra quê?! Ah, papai tá me chamando, é... pra ajudar? Em quê? Decidir?! Mas será que vocês não são capazes de escolher uns míseros óculos sem a minha presença? Ah, tá... Eu sou o desempate. Tá bom. Faço qualquer coisa pra sair logo daqui! mexe a bunda que eu vou atrás...

Cheguei lá. Dei minha opinião. Eu sei que eu tenho razão... é só usar a lógica, mãe... analise o formato do seu rosto. Pronto? Falta pagar? Tá. Por favor, vai logo... Olha, vou me encostar aqui, viu...

Encostei-me no balcão de pagamento, que também o mostruário de relógios... Fui me encostando naquele móvel liso... Encostando, descendo... Acocorei - tédio. Sentei - tééédiooo... podia me cobrir com a barra do vestido de minha mãe. O chão estava confortável. Olhava pr'um lado e pro outro. Nada. Olhava em frente, pro outro balcão. Branco, branco, branco... Vap! Em poucos segundos algo, súbitamente, apareceu diante de minha face melancólica.

Um antebraço. Não qualquer antebraço! Um lindo antebraço! Rechonchudo, delicado... parecia de mármore tamanha a perfeição! Sim! Proporções perfeitas! Passaria os dias, a eternidade a estudar aquela forma. Pegá-los-ia para mim! A dona daqueles antebraço era uma madona de traços regulares, madura... ficaria melhor como uma Vênus de Milo... sem antebraços - que deveriam ser usados para a constante admiração.

A madona foi embora com a mesma velocidade que apareceu, levando consigo os antebraços. Eu jamais veria-os novamente.

domingo, 10 de janeiro de 2010

Estrela da Manhã

Era feia. Ela era essencialmente feia. Por fora, por dentro. Dentro e fora.
Seu rosto cavalar abrigava numerosas papadas escuras.
Sua pele era áspera e sem vida. Sem vida não! Mortificada!
Aliás, era de todo mortificada - das rugas e ao nariz que mais parecia uma batata estragada; Dos olhos de peixe podre aos cabelos de palha; do andar apressado tropeçante à silhueta reta decadente.
Que tristeza! Uma alcoviteira vulgar!-E tinha voz de alcoviteira vulgar! Sim, em toda miserável(ou comum) esquina há uma.

Por que havia de ser tão horrenda? Por que nos incomodar com a sua inútil existência? Por que sujar a estética daquele lugar, que já não era tão belo?

Até o vapor saido de suas narinas era fétido. Tinha cheiro de saliva de moribundo. Seu corpo peguento tinha cheiro azedo - ora como vinagre e carne crua, ora como cominho, alho e cebola crua.

De sua boca saia um bafo terrível, capaz de incomodar um cega a distâncias.

A genital tinha o cheiro de uma peixaria inteira!

As mãos não levavam jeito - o que plantava secava e o que cozinhava adquiria mau gosto.

Mulher desprezível. Sua presença queimava o que a avistava e afastava os bons ventos.


Mas ele a amava.