domingo, 25 de maio de 2008

Uma pequena mácula

"Can you feel a little of love?
Dream on... dream on."


A tarde já ia embora e a bela luz dourada do sol transpassava as janelas. A brisa fazia com que que as finíssimas cortinas brancas levitassem suavemente.
Na cama, a Amada dormia de forma singela enquanto o dourado iluminava seu corpo nu e suado.
Tinha formas um tanto roliças: coxas grossas, panturrilhas redondinhas(as canelas também não eram nada finas), quadris largos, seios fartos. Em seu rostinho redondo abriam-se grandes olhos brilhantes, como pérolas pintadas de sépia; Tudo isso dava-lhe um ar pueril. Pueril também com todo seu jeito, aquela doçura; aquela meiguice de gente que tem medo de explorar o novo, além da vergonha que cultivava de si.
Certa vez, em seu colégio, houve uma excursão ao museu da cidade para que os alunos vissem os singelos quadros de Botelho e eis que um acéfalo grita, com o dedo estendido:
-Ela se parece com esses quadros! -Daí pra frente não houve quem não a chamasse de Botelho na sala de aula.
Mas isso não tinha importância agora, porque ela jamais imaginaria que seria amada daquela forma(quanto mais desejada!).
Ali estava a Amante: Sentada, os olhos saborendo aquele corpo deitado, desejando-a mais e mais. A Amante ainda contemplava sua ninfa doce e bela. Encantou-se com aquele ser desde a primeira vez que a viu e desejava-a como uma criança que persegue a última figurinha que falta para seu albúm.
Bebeu a última taça de vinho branco; só uma calcinha verde-água cobria seu corpo magro, os mamilos duros. Ria-se. Alegria e álcool brincavam no seu cérebro. Conquista. Sim, sim! Conquista! Lutou para tê-la, com seus melhores argumentos estratagemas. Conseguiu sua confiança, seus beijos e sua posse. Pensou como seria daqui em diante: as carícias, os beijos, as posses, os diálogos, a saudade...
A saudade...(!) Mergulhou em algo estranho, o peito apertava crescentemente. Precisava, à partir de agora, agir com discrição e prudência. Mas por quê? De repente viu o panorama completo: Passado, presente e futuro. Para cada descúido haveria uma conseqüência. Não que ela pensasse em si! Aguentava todos os raios que recebia dos céus e todos os olhares de desdém dos conservadores. Mas sabia que sua Amada não. Era frágil... Não fraca! Era doce e muito nova para aguentar a homofobia, a repulsa. Havia deixado uma pequena mácula em seu Amor, inesquecível.
Suas mãos elevaram-se à face enquanto as lágrimas corriam pelas maçãs. Soluços, soluços... Dois ou três. Encontrou-se prostrada diante do leito e só então cessou o choro para contemplá-la. Encantou-se ainda mais.


E eu preciso acreditar que as duas encontraram não só a paixão, mas também o amor. Como uma reza encrustada em minha carne, que não viu pecado no amor.

sábado, 24 de maio de 2008

Aço; puro aço.


Esses dias eu me encontro apática, sem humanidade - seja ela como for-,
puro aço!
Perdendo qualquer espécie de capacidade. Qualquer espécie de paciência.
Sim, eu sou horrenda.
Sim, eu sou falsa e mesquinha.
Tão mesquinha quanto o olhar daqueles ao meu redor na multidão.
Eu sou puro aço: um falso brilho, uma falsa graça.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Quando não, há sempre persistência!


Pela penitência persistente,
pela culpa quase que constante.
Que motivos haveriam ou não...
Quando o vento não entra quente nos pulmões,
toca com frieza a face.

sábado, 10 de maio de 2008

Mal-criada


Eu não penso precisar de compaixão
ou piedade.
Não quero a ternura de desconhecidos.
Eu realmente não preciso.
Nem a obediência dos bons meninos.
[O desejo cruel de cuspir nos dogmas pessoais]
Eu gosto é de distorcer a 'realidade' que esses alheios criam.
Pena que hoje eu não respondi mal ao meu educador,
santo!
Por hoje eu não fui uma menina mal-criada.
Eu não bati o pé e nem fiz biquinho.
Mas eu penso mal,
sim, eu penso mal...
De um modo grotesco.
Prefiro ajoelhar no milho.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Caminhar a dois


Se me encontro na estrada,
se me encontro sozinha
a caminhar,
onde será o fim?
Se me encontro sozinha
a caminhar,
logo me ponho a correr;
Fugir;
[do quê?]
[não sei]
Contudo, devo dizer:
Se estás ao meu lado,
as flores brotam sobre o meio-fio.
Se me abraçares forte, bem forte,
os carros evaecem;
a chuva inrrompe,
o mundo cala,
a lua volta,
o medo vai,
o asfalto brilha;
E talvez até os sapos coachem mais...

Os tiros cessam e meu mundo conhece a paz.
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[Foto: Jennifer e Dave Gahan caminhando... ;D]